segunda-feira, 4 de outubro de 2010

Céu cinzento, memórias nubladas

 
Num domingo cinzento e frio eu estava lá novamente. Depois de quase dez anos, olhando fixamente para ele. Na memória, um milhão de lembranças passavam rapidamente, coisas boas, outras ruins, dias de riso, outros de choro. Tantos sonhos, planos, projetos, alegrias, músicas, decepções e algumas brigas também. Mas o balanço geral era positivo. Ergui a cabeça, respirei fundo, com o coração acelerado e entrei pelo portão do velho prédio do colégio onde estudei por 6 anos da minha vida. Ainda me lembro do primeiro dia de aula, na sexta série, eu perdida, achando que aquela escola era gigantesca. Mas ali, naquele momento, agora mais velha, percebi o quão pequenino era aquele pátio. Na verdade, o que fazia daquele espaço tão vasto eram as turmas intermináveis de adolescentes barulhentos que se reuniam em suas rodinhas nas horas de intervalo. As árvores onde costumávamos encostar para aproveitar a sombra, não mais existem. As paredes, agora com um bege descascado, estavam mal cuidadas. Mas o chão era do mesmo paralelepípedo onde tropecei tantas vezes com meu all star vermelho cheio de estrelinhas rabiscadas com caneta bic e a barra da calça desfiada que arrastava no chão. E mesmo eu estando diferente, mais madura, com a vida totalmente diferente, eu parecia ser a mesma menina. A cada passo, mais e mais lembranças, cada cantinho daquele lugar tinha uma história. Até o vão onde a água da chuva caía foi o protagonista de uma cena hilária, quando uma amiga minha, então com o pé quebrado, foi tentar atravessar o espaço com suas hábeis muletas e acabou estabacada lá dentro, com as pernas para o alto, gritando para alguém ajudá-la. Antes disso oferecemos ajuda para carregá-la, mas ela, orgulhosa, disse que já dominava a arte de caminhar com suas novas companheiras. Tudo bem, pulamos o buraco e seguimos conversando, quando ouvimos um estrondo. Tivemos uma crise de riso, eu, ela e as meninas, lá, sentadas no chão, sem forças para sequer ajudá-la a sair daquela situação. No pátio coberto, apesar de algumas mudanças, tudo continuava exatamente igual. O mesmo cinza do chão, as mesas, a cantina e a escadaria que levava para as salas do andar de cima. Quantas vezes não ficamos sentadas ali, no intervalo ou antes do início das ualas, esperando pelo sinal, com a mesma vontade de entrar na sala de aula de quem vai entrar num presídio. Era dali que observávamos os garotos, os nossos paquerinhas, por quem jurávamos sentir o mais puro e belo amor do mundo. De lá também sentíamos ódio mortal das garotas oferecidas que viviam com eles. Era na escada ou no pátio, sentados no chão mesmo, que dividíamos o lanche, os dramas da adolescência, as revistas teens, o novo cd dos Hanson ou dos backstreet boys, os pôsters para colar no quarto. Fazíamos os testes das Atrevidas e Caprichos, pra saber se “o gatinho está a fim de você” ou líamos vorazmente as matérias para conhecer “dez dicas para conquistar o gato da escola”. Aqui cabe um parênteses para as mulheres que têm mais de 25 anos: qualquer semelhança com a revista Nova, guardadas as devidas proporções, é mera coincidência.

Foi ali dentro que deixei as bandas pops de lado e passei a curtir rock. Começando com o Bon Jovi (tá, não é rock, eu sei), Nirvana, passando por Aerosmith, Metallica, Guns N’Roses, Mercyful Faith, Skid Row e uma lista interminável de bandas. Ouvia tudo o que caí nas minhas mãos. Nessa mesma época fiz novas e inesquecíveis amizades no bairro em que morava e contava animadamente para as minhas amigas o quanto aquela turma era demais! Algumas se apaixonaram pelos meus amigos, para meu ódio mortal, rss. Mudei meu jeito de vestir, passei a pintar as unhas de preto, usar camisetas de banda e a calça jeans rasgada, que eu mesma customizava em casa, sob o olhar da minha mãe, que ao final me dizia: ficou muito legal!! Adorei!! Sorte a minha ter pais que sempre me deram liberdade de escolhas. Tantos outros amigos meus tinham que fazer esse tipo de coisa escondida. Nesse mesmo período tive meu primeiro namorado, um garoto de uma outra escola, mas que fazia parte da turminha do bairro. O namorico durou pouco, mas me lembro perfeitamente do dia em que cheguei na escola e contei a novidade para as amigas. Eu tinha um namorado. Logo depois eu vi que namorar nem era tão divertido assim e que me privar da companhia de tantas pessoas legais por causa de uma pessoa era muito pra mim, que sempre odiei me sentir controlada. Foi ali naquele pátio que vi meu paquerinha lindo (naquela época ele parecia lindo, vai) que estava um ano à frente de mim, numa bela manhã, beijar uma garota conhecida da escola. Não, eu nunca fui muito popular mesmo. Aquela sensação terrível e o drama que todo adolescente faz por causa desses episódios mereceram páginas e mais páginas do meu diário, que inclusive eu guardo até hoje. Mas logo a decepção passou e eu passei a paquerar outro garoto. Foi ali também que decidi ser jornalista e passava tanto tempo contando para as minhas amigas o quanto a profissão era apaixonante e quantos livros eu lia em casa sobre o assunto. Naquele lugar eu devorava livros na pressa de estudar para o vestibular e de me tornar uma jornalista bem sucedida. Lembro de quando quiseram mudar todas as turmas que iriam fazer o 3º colegial no ano seguinte, para o período noturno. Inconformados, organizamos um protesto, chamamos os jornais e emissoras de rádio e tv, fizemos passeata, exigimos reunião com o delegado de ensino e a diretoria da escola. Foi uma sensação de vitória sermos ouvidos. O resultado foi uma conciliação e a turma da passeata na capa do principal jornal de cidade no dia seguinte. E eu já me sentia uma jornalista! Hahahah.

Olhando novamente para aquelas paredes, aquelas salas, tão descuidadas, abandonadas, senti um misto de nostalgia e tristeza. Pode ser arrogância minha, mas duvido que os adolescentes de hoje que estudem naquela escola vivam as coisas com o entusiasmo e um pouco da inocência que o mundo ainda nos permitia ter.  Não faço ideia do que aconteceu com meus “eternos amigos” e colegas daqueles anos especiais. Mas sou capaz de lembrar do rosto ou do nome completo de muitos deles, sem falar das piadinhas, até hoje. Acho que não fiquei ali mais do que 10 minutos, enquanto esperava meus amigos votarem, mas foi o suficiente para trazer à tona um misto de sensações e lembranças que eu nem sabia existirem dentro de mim. Engraçado como tudo se encaioxou perfeitamente. Voltar àquele lugar, àquela cidade, em um fim de semana onde tantas coisas do passado vieram de encontro a mim, me permitiu reviver alguns bons momentos. Coincidência ou não, todos os reencontros que tive ali naquela cidade fizeram parte do mesmo período da minha vida. Como tudo, talvez esse reencontro tenha sido uma despedida, ou talvez seja apenas um até logo que deixou saudades, afinal, o mundo é mesmo uma pracinha e nunca sabemos o quê ou quem iremos encontrar na próxima volta.

terça-feira, 17 de agosto de 2010

O fluxo



Velocidade. O fluxo do pensamento que não deixa dormir. O vai e vem, o vão, o céu, o sol, o medo, a dúvida, o tédio, a raiva, tristeza, melancolia, alegria, instabilidade... a instabilidade. A graça, a surpresa. O inesperado ou o nada. Caos? Temo, choro, rio, ouço, vejo, me calo, quero gritar, me contenho, quero cantar mas não posso. Saltar rumo ao abismo? Mas já não saltei? A dúvida, o credo, a esperança, a confiança, o sorriso, a decepção, desilusão. Não quero, mas quero, não deveria, mas ajo, sumiria se conseguisse, prometo e não cumpro, me esforço e é em vão. Amo ou odeio, desejo ou rejeito, preciso ou desdenho, questiono, me revolto, passos firmes, coração apertado, flutuar, desistir, resistir. Cálculos, contas, racionalismo, teoria, planos, projetos, procurar objetivos, foco, mas são tantas coisas, desisto, esqueço, subentendo, imagino, crio, recrio, copio, me inspiro, me pergunto, por quê? Por quê???? Preciso esquecer e não consigo? Não sei, nada resolvido, ausência, presença, incógnita, ah, sim, isso até faz sentido, ou não faz? Lembranças, memórias, estórias, saudades, inquietação, ansiedade, eu quero, resposta, silêncio, a confusão que se faz presente, mistura, frenética, realidade, sonho, frustração, sonho, passado, sonho, revivo, vivo, sobrevivo. A noite, uma estrela, o vácuo, escuridão, frio, o vento, o vapor, a quietude, o zumzumzum das folhas, do pensamento, do coração. Querer voar, pousar ali, uma casinha, interior, lua clara, face iluminada, a calçada, a rua, braços abertos, a árvore, o tempo parou, tudo congelou e agora, o que será? O que foi ou o que não foi, hoje ou amanhã, bem-vindo, até mais, adeus ou fique aqui, no caos, de mãos dadas, apoio, amizade, força, ir em frente, amor. Sou eu? É você ou ninguém?

segunda-feira, 19 de julho de 2010

O dia em que descobri a importância de um bom oftalmologista

Quem me conhece bem sabe que desde criança, acho que desde os 6 anos, eu uso óculos. O grau sempre foi baixinho, bem menos que 1º, para miopia (até hoje não decorei, é isso que tem quem não enxerga de longe?) e astigmatismo (já me explicaram um milhão de vezes no que consiste e eu sempre esqueço). Bom, o fato é que trabalhando ao longo de alguns anos diante de um computador por no mínimo oito horas diárias e acrescentando o tempo de computador em casa e na frente da tv, minha vista tá bem ruinzinha nos últimos tempos. Tenho enxergado tudo bem embaçado, isso me incomoda, digo que vou ao oftalmologista, mas a correria sempre me faz deixar a consulta para depois.
Enquanto o enxergar embaçado não te faz passar por nenhuma situação ridícula, do tipo entrar tagarelando na roda errada de amigos (sim, eu já fiz isso quando era adolescente e ainda enxergava perfeitamente), está tudo sob controle, mas esse não foi o meu caso. No último feriado, depois de três meses sem ir visitar a família no interior, fiz as malas e fui feliz e contente rumo à Araraquara. Depois de cinco horas de viagem e uns cochilos, desci na rodoviária e fiquei sentadinha em um banco à espera de meu amado pai. Antes tivesse ficado por ali até ele ir me buscar pelas mãos…



Mas não, criatura apresssada, logo vi um carro igualzinho ao do meu pai (juro, era o carro dele!!!) parar próximo ao estacionamento. Olhei de longe e embaçadamente o vi lá dentro, calça de moleton preta e uma blusa de frio meio bege e o óculos pendurado no pescoço. Ok, meu pai tem uma roupa assim. Não pensei duas vezes, levantei, fui feliz e contente em direção ao veículo. Abri a porta de trás calmamente, coloquei (não, na verdade eu joguei) a minha mala no banco de trás, abri a porta da frente, sentei no banco do passageiro e olhei para o lado. Acho que demorou uns segundos pra eu me tocar que o “meu pai” estava um pouco diferente. Forcei os olhos pra ver se conseguia focar direito, devo ter feito uma careta horrível por causa do susto que tomei e aí pensei: “Meu Deus, será que em três meses meu pai emagreceu tanto que ficou assim???? Ou será que ele tá doente e ninguém me contou??”

Quando já estava me forçando a acostumar com o meu pai meio esquisito e desfigurado, o pouco de bom senso que me resta se fez presente: Não, aquele não era o meu pai, eu tinha entrado no carro errado!!!!! Fiquei uns segundos olhando pra frente, pensando no que dizer, virei para o senhor e disse: Acho que você não é meu pai… Ele, sério e na maior calma do mundo, respondeu: Não, eu só vim buscar a namorada do meu filho… Juro que o tom dele era uma tentaviva desesperada de se explicar, como se ele tivesse entrado no meu carro e não eu no dele!!! Aí eu comecei a rir muito, pedi desculpas, saí do carro, dei de cara com a tal nora do cara, falei sei lá o quê, abri a porta de trás, tirei a minha mala e fiquei em pé, parada lá no estacionamento, rindo igual a uma retardada. Quem viu a cena, não deve ter entendido nada e aposto que o cara que tava sentado do meu lado no banco, esperando irem buscá-lo assistiu tudo de camarote e se matou de rir. Mas eu nem me dei ao trabalho de olhar pra trás, pra não piorar as coisas.

Só sei que até hoje não acredito que fiz isso. Claro que quando meu pai chegou eu contei a ele e pra minha mãe o que tinha acontecido. Eles se mataram de rir e minha mãe disse que sentia vergonha pelos outros, no caso, por mim. Pena que ninguém filmou tudo e pena maior ainda que eu estava sozinha, não tinha ninguém pra rir comigo na hora. Agora, uma coisa me intriga: por quê aquele senhor ficou pacientemente só observando o que essa doida que vos escreve ia fazer? Por quê ele não falou algo como: Ei, sai do meu carro, quem é você? Vai ver ele estava viajando… Ou vai ver ele também enxerga tão mal quanto eu (lembrem-se do óculos pendurado no pescoço). O fato é que a resposta eu nunca saberei. Depois dessa já avisei lá em casa: todo mundo que for me buscar em qualquer lugar ou desce do carro e vai até mim, ou buzina, ou liga no meu celular. Do banquinho, espontaneamente, eu juro que nunca mais levanto!!! Ah, a consulta no oftalmo? Ainda não marquei, mas eu irei, em breve, bem antes de trombar num poste ou cumprimentar o amigo errado.

domingo, 18 de julho de 2010

O REBELDE



Pergunta:
Amado Osho
O caminho do rebelde é o caminho do meio ou o caminho dos extremos?
Tenho ouvido você falar a favor e contra ambos, e também dizer que não existe caminho. O que guia o rebelde?

Osho: O REBELDE NÃO TEM caminho algum para seguir; aqueles que seguem algum caminho não são rebeldes. O próprio espírito de rebeldia não necessita de qualquer orientação. Ele é uma luz em si mesmo.

As pessoas que não podem se rebelar pedem por uma orientação, querem ser seguidoras. A psicologia delas é a de que ser um seguidor as alivia de todas as responsabilidades; o guia, o mestre, o líder, o messias se tornam responsáveis por tudo. Tudo o que se requer do seguidor é apenas que tenha fé. E apenas ter fé é um outro nome para escravidão espiritual.

O rebelde está em um tremendo estado de amor pela liberdade - liberdade total, nada menos que isso. Daí ele não ter salvador, mensageiro de Deus, messias ou guia algum; ele simplesmente vive de acordo com sua própria natureza. Ele não segue ninguém, não imita ninguém. Certamente ele escolheu o modo de vida mais perigoso, cheio de responsabilidades, mas de uma alegria e liberdade tremendas.

Ele muitas vezes falha e comete erros, mas nunca se arrepende de nada, porque aprendeu um profundo segredo da vida: ao cometer erros você se torna sábio. Não existe outra maneira de se tornar sábio.

Ao extraviar-se, você conhece mais claramente o que está certo e o que está errado, porque tudo aquilo que lhe dá miséria, sofrimento, que torna sua vida uma escuridão sem fim, sem amanhecer... isso significa que você se extraviou. Perceba-o - e volte novamente para o estado de ser onde você está em paz, silencioso, sereno, uma fonte de felicidade, e estará novamente no caminho certo.

Estar em estado de graça é estar no caminho certo.
Estar infeliz é estar errado.
A peregrinação do rebelde está repleta de surpresas. Ele não tem mapa nem guia, assim, a cada momento está entrando em um novo espaço, em uma nova experiência - em direção a sua própria experiência, à sua própria verdade, ao seu próprio êxtase, ao seu próprio amor.

Aqueles que são seguidores nunca conhecem a beleza de experenciar coisas novas. Eles sempre têm usado conhecimento de segunda mão, e fingido serem sábios. As pessoas são certamente muito estranhas. elas não gostam de usar sapatos de segunda mão. Mas quanto lixo elas estão carregando em suas cabeças... simplesmente, sapatos de segunda mão! Tudo o que elas sabem, é emprestado, imitado, aprendido - não pela experiência, mas somente pela memória. O conhecimento delas se consiste em memorização.

O rebelde assemelha-se a um pássaro voando no céu; que caminho ele segue? Não existem estradas no céu, não existem pegadas de pássaros ancestrais, de pássaros notáveis, Gautamas Budas. Nenhum pássaro deixa qualquer pegada no céu; portanto o céu está sempre aberto. Você voa, e faz o seu caminho.
Encontre a direção que lhe dê alegria. Mova-se para a estrela que toque sinos em seu coração. Você deve ser o fator decisivo, ninguém mais!"


OSHO

domingo, 11 de julho de 2010

Alice?

Dos sonhos de criança às aventuras adolescentes. Do cinza que torna a realidade da vida adulta tão dura, presente e em tantas vezes difícil de acreditar, de compreender e aceitar. Por quê há tantas pessoas no mundo, mas ninguém se conhece de verdade? Não há mais espaço para o afeto, a confiança, a sutileza, a ingenuidade. Perdemos muito mais do que a noção de certo e errado, perdemos a noção do que somos e de quem são os outros. Todos querem atenção, carinho, amor, mas se recusam a fazer um mínimo de esforço para dar tudo isso em troca. Não, troca não é a palavra certa, porque pressupõe acordo, interesse e tudo isso tem que ser espontâneo. Deixamos de ser espontâneos e sem perceber perdemos também a essência, a liberdade. Bonito é se preocupar apenas com você, com a sua carreira, o seu carro novo, as roupas de marca e os bares da moda. É rídiculo demonstrar sentimentos, pior ainda deixar transparecer que precisa de alguém, sinal de fraqueza. É por essas e outras que nas ruas, estão todos perdidos, vivendo no automático, sem saber direito o que fazem e por qual motivo o fazem. Indo e vindo, em marcha, fingindo ser o que jamais serão, bem resolvidos, confiantes. No fundo, são poços de frustrações, sofrimento, arrependimentos, mas que tudo isso se dane, precisam se defender, sobreviver. Assim, a troco de quê? Com qual propósito?


Carcaças vazias, ambulantes. Em algum lugar se perdeu o que dava sentido à tudo. Mas ninguém quer dar o braço a torcer. Que todos os reais anseios e sentimentos fiquem escondidos, guardados e no máximo apareçam em pensamento enquanto esperam o trem ou na hora de dormir. Mas que passem rapidamente, diante da velocidade da vida e das obrigações do cotidiano. E que o essencial seja sempre ignorado, porque temos medo de parecermos ridículos, idiotas, fracos, sentimentais ou apenas ignorados. E assim segue a multidão, homogênea, egoísta, fria, podre, desinteressante.


Cavaleiros solitários, brigando com o mundo e ignorando a batalha mais importante: a pessoal, de nós mesmos, aquela que faz toda a diferença entre a vida que se quer e a que se tem, entre compartilhar e seguir sozinho. Porque muito mais fácil é olhar pra fora e apontar o dedo, acusar, se “indignar”, fingir se importar. Difícil mesmo é parar e perceber que o que está perdido dentro de cada um é o que realmente faz a diferença entre o mundo cinza e o arco-íris que surge tímido no horizonte. Algumas raras pessoas parecem já ter percebido isso. Sorte delas. Enquanto isso a maioria segue perdida, porque a névoa densa do medo as impede de serem o que realmente são e de viverem a vida plenamente. Fingem a maior parte do tempo e no fim do dia se recolhem em suas casas, tristes, solitários, amargos. Nada que uma boa dose de qualquer bebida não amenize, que uma conversa superficial na internet não faça esquecer e dê a falsa impressão de interação, de companhia.



Enquanto tudo segue anestesiado, a garotinha do papai segue correndo na floresta, com o vestido azul de festa rasgado e alguns arranhões e tombos conquistados ao longo do caminho. Algo semelhante com aquela Alice e seu país das maravilhas? Não faz mal. Antes os desafios da floresta do que o cinza da cidade, que cega. É melhor continuar assim, descobrindo novas trilhas e atalhos, conhecendo os seres fantásticos e mantendo o coração cheio de esperança e carregado daquelas boas sensações e momentos da adolescência. Especialmente do confuso e enigmático garotinho que passava algumas horas do dia tentando convencê-la de que era bom comer formigas. E ela ria, pura e despretensiosamente, desejando que aquelas tardes jamais tivessem fim. Na verdade, o que ele queria era mostrar para ela as ínumeras possibilidades que só se enxerga quando se tem 15 anos. Ela também desejava desbravar o mundo com ele, mas o medo, aquele mesmo que hoje perturba as pessoas, de certa forma já a impedia de dar sua mão a ele e seguir estrada afora.




Mas nem tudo está perdido. Todos esses ideais e sentimentos continuam ali, adormecidos, esperando o momento certo para virem à tona. Basta apenas que ela o reencontre numa bela tarde de outono, ali, debaixo daquela árvore, como se o tempo não tivesse passado. Porque muitas coisas podem mudar, mas algumas continuam iguaizinhas, por mais que a gente duvide ou tente disfarçar. E o que parecia o fim, há mais de 10 anos, na verdade pode ser apenas o começo…

segunda-feira, 7 de junho de 2010

Is we in the train!!


Todos os dias o trem carrega mais do que pessoas por São Paulo. Atravessa bairros, ruas, passa por inúmeras estações, carrega histórias, lembranças, dissabores, carrega vida. Embora muitas vezes as pessoas se pareçam mais com bonecos, estáticos, à toa. O trem, que por décadas levou o desenvolvimento ao interior do País, ainda hoje leva para todos os cantos as aqueles que fazem o País prosperar, produzir. Em alguns meses indo e vindo diariamente no trem presenciei encontros, desencontros, pessoas felizes, pessoas tristes. Alguns gostam de conversar, outros nem tanto. Muitos passam todo o caminho em silêncio, entretidos com suas leituras ou perdidos em devaneios enquanto ouvem suas músicas no mp3. Sonhos, frustrações e pensamentos. Projetos, vontades, questionamentos. O que foi e não deveria, o que poderia ter sido, mas não foi. Em algumas das minhas viagens eu sou como aquelas pessoas. Em outras não. Na maior parte das minhas viagens de trem, quem me acompanha, geralmente na volta do trabalho para casa é Eduardo Savanachi, também repórter e meu colega de trabalho. Nas primeiras vezes em que pegamos o trem juntos, logo que eu havia entrado na editora, nossas conversas eram similares a papo de elevador:

Eduardo: e aí Ju, tá gostando?
Eu: tô sim, o trabalho é bem legal…
Eduardo: ah, que bom.

Isso era tudo o que conversávamos ao longo do trajeto que incluía uns 20 minutos de trem e outros 20 de metrô, todos os dias… bons tempos aqueles, rss. Porque agora…. Preciso levantar a mão pra ter uns minutos pra falar!! Hahahah. O fato é que de tanto fazermos o mesmo trajeto nas idas e vindas do trabalho, o papo tinha que se desenvolver, senão era mais fácil cada um entrar num vagão diferente e ir ouvindo música. Mas, como toda história sempre tem um mas e como liberdade é uma merda mesmo, hoje a gente só fala abobrinha. Tem de tudo, desde as histórias da época em que o Edu era um quase rockstar, passando pela minha fase roqueira em Bauru city, depois pela faculdade e pela pinga de garrafa pet, pelas doses de vodka no gira-gira e por aí vai. Até música em homenagem ao trem o Edu já compôs!! Foi uma paródia da música O trem das 7, do Raul Seixas, que até agora deve estar incorfomado no túmulo com o estrago que causaram… Brincadeiras à parte, eu adorei a nova versão, que conta inclusive a passagem em que a Vivi, nossa outra colega de bancada e revista, dança na plataforma enquanto espera o trem. Mas esse é um outro causo.

No resumo, quase não dá pra aproveitar o teor das coisas que a gente fala, sem contar que basta olhar para o lado e ver na cara dos demais passageiros os pontos de interrogação ao ouvirem nossas conversas “construtivas”. Independente disso, o fato é que eu me mato de rir com as coisas que a gente fala e de quebra ganhei um novo amigo. Depois de um dia corrido e estressante de trabalho, só a ideia de pegar um trem pra chegar em casa desanima qualquer criatura. No nosso caso, apesar de ser cansativo e de eu odiar andar de trem, eu diria que o trajeto é uma espécie de terapia, porque a gente se diverte falando asneira. Só fica faltando mesmo uma cerveja gelada e um pote de amendoim pra acompanhar. Se bem que se for numa sexta-feira, tudo isso é providenciável e por apenas um real cada item. Pelo menos é o que gritam os vendedores ambulantes pelos vagões, que continuam indo e vindo, repletos de pessoas e histórias… As minhas, as suas, as nossas.

sábado, 15 de maio de 2010

Quanto vale a vida?

Da última vez em que ela o viu, não era uma despedida anunciada, mas sim um até breve. Foi o que ela pensou. Um dia voltaremos a nos encontrar, tenho certeza. Mas a certeza nem era tanta assim. E logo depois daquele final de ano, com o fim das aulas vieram as férias e as expectativas. O vestibular e muitas mudanças. E com tudo isso, ela se esqueceu dele e da certeza do reencontro. Com o passar do tempo vieram novas experiências, amizades, alguns amores felizes, outros frustrantes. E sim, por algumas vezes ela se lembrou dele. Onde estaria? O que estaria fazendo? Teria casado, com quem? E mais importante do que aquelas indagações, eram as lembranças que tinha dele. Poucas é verdade e bastante distantes. Mas às vezes gostava de se lembrar daquela época com saudade. Saudade não só do que viveu, mas do que gostaria de ter vivido. Algumas notícias de longe, pela internet, de vez em quando. E ela pensava: "Quem sabe um dia?" Afinal, o mundo é imenso sim, mas algumas vezes a vida nos dá uma segunda chance, um reencontro, pra que possamos fazer diferente do que foi na primeira vez. E então, um dia, em meio a um turbilhão de mudanças e muitos acontecimentos, enquanto ela tentava superar algumas coisas que a faziam sofrer, e iniciava uma nova fase da sua vida, ele ressurgiu em um recado despretensioso, sim, um recado. Depois de quase 10 anos? Não acreditou no que viu. "Será que foi mesmo para mim? Não teria errado o destinatário? Mas nós nunca nos falamos..." Independente disso, ficou feliz.  E mais do que isso, diferente da outra vez, decidiu arriscar, tudo bem, não era um risco tão real, mas um risco, para quem sempre havia se recolhido ao canto da sala durante um ano e apenas observava. E o fez. E arriscou. Era a prova de fogo. Fazer diferente dessa vez, se permitir tentar, de coração aberto. Ao que parece, ele também consentiu, se mostrou receptivo, feliz com o reencontro. E quando ela o olhou, percebeu que algumas coisas tinham mudado sim, para os dois, mas que ele era essencialmente o mesmo que a encantara há tanto tempo. Mas o tempo e a dureza do dia a dia sempre se encarregam de dificultar as coisas e de afastar as pessoas. Não, ela não queria que isso acontecesse, queria agir diferente de todas as outras vezes em qu se viu envolvida, mas parecia não saber como. E ainda não sabe. Mas uma voz insistente soprava em sua mente e lhe dizia insistentemente: seja sincera, verdadeira, do seu modo, mas o faça. Afinal, quanto vale a vida sem as pessoas que são importantes para nós? E não é que de fato a voz tinha razão? Então, ela decidiu-se por dizer a ele que estava feliz, que ele era importante na sua vida e que desde o reencontro, ela pensava nele todos os dias, não com aquela obssessão juvenil, mas com uma calma, uma certeza e uma vontade típicas de quem sabe de fato o que quer. E então, ela se abriu com ele, da maneira que melhor sabia fazê-lo: escrevendo.

domingo, 18 de abril de 2010

O melhor amigo que alguém pode ter

Há 6 anos, quando eu tinha lá meus 19, 20 anos (não façam contas!!!!), ganhei do meu pai um lindo cachorrinho, ao qual dei o nome de Lippi. Ele era um dashund lindo, marrom, com aquela cara fofa que todo filhote tem e compridinho, igual ao famoso "salsichinha da Cofap", que não se lembra dele? Pois bem, já tive muitos cachorros na minha vida, mas o meu pequeno Lippo-Lippo era e é muito especial. Ele sempre foi meu parceiro paciente em alguns dos mais importantes momentos que vivi durante estes últimos anos, bons e maus. Talvez eu nunca tenha dito isso à ninguém, mas durante muitas das vezes em que eu fiquei triste ou tive crises de síndrome do pânico, era ela que me acalmava. Nessas horas, eu ia até o quintal e ele me recebia todo feliz, pronto pra brincar. Em algumas outras ocasiões, como que sentindo a minha angústia ou tristeza, ele se contentava em deitar no meu colo, como quem quer dizer, "tudo vai dar certo, estou do seu lado, incondicionalmente". E de fato foi isso o que ele sempre fez. Quando ele tinha 1 aninho, fui morar fora para fazer faculdade e nunca mais voltei a morar com os meus pais. Durante todos esses anos, obviamente eu não tinha a menor condição de levá-lo comigo, então, lippo-lippo ficou na casa deles, mas sempre desejei poder um dia trazê-lo pra morar comigo. Sempre senti muita falta dele e todas as vezes em que ia visitar a família, o primeiro de quem eu queria saber era do Lippi, era ele também que eu ia abraçar e apertar, antes de todo mundo. Ele era meu filhote, meu companheiro, chorão é verdade, mas a única criatura desse mundo que oferecia um amor e uma fidelidade incondicionais, algo que nenhum ser humano jamais será capaz de oferecer a quem quer que seja. Quando eu brincava com ele todas as dores, as preocupações, as incertezas desapareciam. Era como se fôssemos só nós dois ali, brincando, despretensiosamente. É por causa dele que esse blog se chama "Conversando com o cachorro". Pois bem, meus pais estão se mudando para um apartamento e vetaram a presença dele lá. Eu entrei em pânico, bati o pé, briguei com todo mundo, não, ninguém iria dar ele pra quem quer que fosse!!!

                                              A última foto que eu tirei do Lippi

Neste final de semana, porém, quando perguntei por ele ao telefone, percebi o silêncio da minha mãe e na hora saquei que algo tinha acontecido. Meu coração disparou. Não consigo lembrar da cena sem ficar com os olhos marejados. Sem me consultar, eles decidiram dar meu amado cãozinho para uma menina. Mas que menina. "Não sei, a filha de uma amigo do vizinho da puta que o pariu!!!!" Só faltou ela dizer isso. O que eu senti? Não dá pra descrever. Uma dor no coração, uma agonia, levaram meu cãozinho de mim há quase 10 dias e ninguém, NINGUÉM me disse nada?!?!?!?! Como puderam??? Fiquei histérica, gritei horrores e desliguei o telefone na cara da minha mãe. Juro que me senti e me sinto enganada. Pior do que isso, quem me garante que vão cuidar dele direitinho?? Estou tão triste e tão chateada. Quem não gosta de animais e estiver lendo isso, vai achar que é chilique de menina mimada, mas não é. Só eu sei o amor que tenho por ele e o bem imenso que ele sempre me fez, desde o dia em que chegou numa caixinha, enrolado em uma toalha. Deram meu cachorro pra um desconhecido e sabem por quê?! Pra ele não fazer barulho, não incomodar os vizinhos do prédio... Mal sabem que ao levarem o Lippi embora, levaram também um pedacinho do meu coração que desde ontem tá apertado. Levaram também o meu companheiro de alguns dos melhores e mais importantes momentos da minha vida.

terça-feira, 16 de fevereiro de 2010

Sei não...

Terça-feira de carnaval... Pra mim é só mais um feriado, já que eu não sou fã de carnaval e durante esses dias prefiro mil vezes encontrar um lugar tranquilo pra descansar e pensar na vida do que correr atrás do trio ou do que quer que seja. Dessa vez, infelizmente, não deu pra planejar uma viagem, até porque não conseguimos reunir a turma e no fim das contas cada um foi pra um lado diferente. E como eu não sou tão descolada a ponto de ir viajar sozinha, vim descansar no interior, rever a família, passear com o cachorro, almoçar com os tios e avós, coisas banais que a gente só se dá conta de como são boas de fazer, quando não podemos fazê-las com frequência, hehehe. Enfim, agora, feriado acabando e eu já começo a lembrar de tudo o que me espera nesse restinho de semana. Pelo menos deu pra descansar um pouquinho, repor as energias. Só preciso mesmo é tomar vergonha na cara e atualizar esse blog mais vezes, mas pra isso tenho que relembrar boas histórias e me inspirar para escrevê-las, coisa que tá meio difícil de acontecer... Então, o negócio é deixar as coisas seguirem seu rumo que daqui a pouco a inspiração retorna. Tô precisando dar uma movimentada na vida também, pra ampliar o repertório e as possibilidades. Vamos ver, quem sabe.